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ARLETE PIEDADE
Representante em Portugal
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Arlete Piedade Louro.
Escritora, poeta e divulgadora cultural. Foi uma das fundadoras da
U.L.L.A.-União Lusófona das Letras e das Artes, da qual é Vice-Presidente.
Colaboradora do Jornal e Rádio Raizonline, do qual foi Chefe de Redação,
cronista e apresentadora da rádio. Realizou e apresentou os programas de rádio, Falar Poesia de divulgação de poesia declamada de vários autores e
gravada pela própria e Arlete Convida
com entrevistas de personalidades ligadas á literatura lusófona e ás artes. Consul em Santarém do Movimento Poetas
del Mundo.Obras próprias publicadas: Sonetos da Fada das Letras (poesia); O
Princípe de Ofiúco (Fição Científica); Era no tempo de...Crónicas de Outras
Épocas(crónicas); Olhares de Saudade volume I - romance sobre emigração em
parceria com o escritor cabo-verdeano e Embaixador de Poetas del Mundo em Cabo
Verde, João Furtado. E-Book: Sonhos e Emoções (poesia). Participação em
antologias em Portugal: Poetas de Santarém, edição do Jornal O MIRANTE, Horizontes
da Poesia II - Colectânea 2010 do grupo de poesia Horizontes da Poesia; Antologia
de Poesia Contemporânea Entre o Sono e o Sonho volume V da Chiado Editora -
Lisboa; Antologias da U.L.L.A - União Lusófona das Letras e das Artes:
Antologia de Natal, Antologia para os Pais, Antologia do Amor, Antologia do
Silêncio e Antologia Tema Livre. Participação nas Antologias publicadas no
Brasil: Dois Povos-Um Destino, Convergentes, Brasil e Portugal - Elos Poéticos, 3ª
Colectânea Poética do Guará, (Uni)Versos. Participação em livros de autores
brasileiros: O Verdadeiro Paraíso de
Carlos Ventura (Comentário nas orelhas/badanas da capa); Eu Varenka de Varenka de
Fátima Araújo com poesia em acróstico do nome da autora; Posfácio do livro Sem Poesia Nem Pensar, de Lenir Moura. Colaboração na edição e
apresentação do livro Casulo de Meg Klopper. Poemas e textos publicados em
sites de literatura e blogs em Portugal, Brasil e Argentina. Prémios
concedidos: 5º Lugar no 4º Concurso Artístico Histórias de Natal com o conto A
Chegada. Menção Honrosa Poema Quisera no III Concurso de Poesia Editora
Guemanisse. 3º Lugar Poema Era Uma Vez no Concurso Escrevendo e Revivendo da
Editora Litteris do Rio de Janeiro - Brasil. Menção Honrosa Poema Amizade
Concurso Cultural Brasil Casual Edição 2013 - Publicado na Antologia Poética
(Uni)Versos.
Poemas:
O
QUE É A POESIA!
Poesia
é sentir cá dentro uma mensagem pungente
que
tem que ser libertada em palavras de emoção
ofertada
ao mundo sem nada esperar! Somente...
o
preito do reconhecimento, e a oferta da paixão!
Poesia
é ser portadora da arma certa para combater
metralhadora
com balas compostas de tinta e papel
a
indignação como mola de arremesso ! E assim fazer
a
revolução pelo Mundo! Como nova Torre de Babel!
Tantas
as línguas quantas as necessárias à mensagem
que
o poeta tem que ser das palavras, o transmissor
lançadas
sobre o planeta, arremessadas com coragem!
Poetas
de todo mundo , união não deve ser miragem
temos
que usar na salvação da Terra, a força do amor
ou
o futuro de nossos filhos será sugado pela voragem!
Arlete
Piedade Louro
AMAZÓNIA
- PULMÃO VERDE E RUBRO
És
verde e rubro, o pulmão deste planeta azul e branco
Verde
das florestas em extensão, rubro das queimadas
Estendendo
longos dedos negros em direcção ao flanco
Da
mãe ignorada pelos filhos de quem devia ser amada
Noutros
tempos eras verde, azul, claro, limpo e puro
No
teu seio criavas belos seres, de alma transparente
Um
belo e imponente rio atravessava teu corpo e juro...
eras
a mais preciosa jóia deste planeta de alma doente
Mas
os homens de distantes terras, foram chegando
De
teu sadio, fértil, bravio e belo corpo se apossando
Para
seu deleite, prazer, sendo a riqueza fácil, o tema.
Teus
tesouros foram furtando, teus rios conspurcando
Teus
habitantes foram corrempendo, mulheres violando
Ainda
será tempo de te salvar, sendo esse nosso lema?
Arlete
Piedade Louro
AMIZADE
Amizade
não se rege pela idade
nem
olha á cor de pele diferente
não
importa se é longe a cidade
onde
mora esse amigo da gente!
Amizade
não liga ao continente
ou
se tem uma travessia de mar
amigo
é um ser-se transparente
uma
forma desprendida de amar!
Não
importa o tempo decorrido
anos,
meses, dias, pois o amigo
acorre
lesto, ao nosso chamado...
amigo
é o nosso irmão escolhido
outro
sangue, mas bem acolhido
na
casa onde também é amado...!
Arlete
Piedade Louro
No
Brasil: Menção Honrosa
Concurso Cultural Brasil Casual - 2013
publicado na Antologia Uni(Versos).
Em Portugal, publicado na Antologia de Poesia
Contemporânea "Entre o Sono e o Sonho" da Chiado Editora
ABRIL LIBERDADE
Tu,
que foste militar de Abril e fizeste a revolução,
saindo
de Santarém, na Escola Prática de Cavalaria,
até
atingir Lisboa, pela madrugada silenciosa e fria,
agora
sexagenário, que balanço fazes da situação?
Tu,
que foste preso e torturado, pela Pide sinistra
para
abafar a tua voz, que denunciava a injustiça,
partiste
para o exílio, buscando viver a liberdade
voltaste,
e agora, ainda continuas a ser socialista?
Tu,
mãe que em África, os teus filhos, enterraste
e
agora sobrevives com uma miseravel
pensão,
vais
morrer de fome, abandonada num casebre
até
o teu mau cheiro, atrair algum bicho ou cão?
Tu, nobre povo, que navegou nas naus e caravelas,
enfrentando
o mar bravio e os monstros oceânicos,
destes
mundos ao Mundo, pioneiro da globalização,
hoje
partes, em busca da dignidade, longe deste chão?
Senhores
do capital, corruptos, usurários e agiotas
compram
os políticos eleitos pelo povo da nação,
despojam
a pátria de Camões, do fruto do trabalho
o
deserto árido, deixam á futura geração, patriotas?
LIBERDADE
gritam os povos, oprimidos e escravizados
LIBERDADE,
gritaram em França, no assalto á Bastilha
LIBERDADE
gritaram os escravos nas naus aprisionados
LIBERDADE
gritaram os negros em África colonizados!
LIBERDADE
gritaram os operários no 1º de Maio, explorados
LIBERDADE
gritaram as mulheres na fábrica, queimadas
LIBERDADE
gritam os homossexuais no amor discriminados
LIBERDADE
gritam as crianças da sua infância, espoliadas!
LIBERDADE
gritam os polícias, e os guardas
prisionais
LIBERDADE
gritam todos os povos que aspiram a mais
Todos
querem melhor vida, casas, carros e
dignidade
Prendam
os ladrões, confisquem o capital
reinventem
Abril, libertem a LIBERDADE!!!!
Arlete
Piedade Louro
Poema
participante no Evento comemorativo do Dia Mundial da Poesia em Santarém, em 22
de Março de 2014 - Poetas da Nossa Terra - IV Encontro de Poetas Locais
BOMBEIRO
Será
só da natureza ardente pelo calor extremo do verão
ou
também do descuido do homem com a mata e
floresta?
Então
porque se encontram vestígios criminosos pelo chão
e
onde o incêndio lavra, árvores ardem, casas e nada resta?
Como
podem culpar esses heróis abnegados, os bombeiros,
quando
no Inverno, lhe retiram subsídios e negam material !?
Se
ao surgir o fogo imparável e aterrorizador,
são os primeiros
sem
dormir e comer , incansáveis enfrentam o calor infernal?
Tudo
esquecem, a família, os filhos, os sonhos e até a sua vida
ao assumirem um compromisso sagrado, uma divina
missão
de
ajudarem a humanidade a derrubar esse terrível inimigo...
no
afã de chegaram ao seu destino, e iniciaram a sacra lida
acidentes
ocorrem, bens e heróis despedaçados pelo
chão
ou
cercados pelo fogo, carbonizados, desprezando o perigo...
Arlete
Piedade Louro
Publicado na 3ª Colectânea Poética do Guará-
Brasília - Brasil
AMANHECER
Depois
de uma noite escura
chega
sempre o amanhecer
a
infelicidade encontra cura
na alma límpida a florescer!
Transparece
doce esperança
nas
cores do céu ao alvorecer
a
madrugada traz a confiança
que
em breve o sol irá nascer!
Chispam
raios de luz colorida
um
espectáculo cada manhã
Deus
nos dá, sem pedir nada...
a
amizade cura toda a ferida
amigo
irmão, amiga tua irmã
juntos
esperando a alvorada...
Arlete
Piedade Louro
Editado
no livro "Falar Poesia"
CUME
DA MONTANHA
Subi
á mais alta montanha
como
uma águia liberta planando no ar
que
busca alimento para os filhos criar
e
um pouso seguro para construir o ninho
e
lá do mais alto cume, espraei o olhar
pelos
cumes e cordilheiras distantes
até
a vista se perder nas lonjuras azuis
e
só conseguir imaginar
o
azul distante do mar.
Deixei
o pensamento vaguear, viajar
transpor
as distâncias abismais
atravessar
o oceano e as vagas eternas
e
tão semelhantes á montanha
que
a meus pés se estendia
e
compreendi o mundo
como
era um corpo uno e vivo
um
imenso organismo vivo
que
ondulava e respirava e vivia
como
uma gigantesca baleia
com
um minusculo coral no dorso
que
era eu...
Tão
pequenos e efémeros que somos
humanos
surreais que se julgam deuses
que
podem ser anjos e logo demónios
construir
obras de arte e logo em seguida
torturar,
destruir, assaltar, assassinar
amar
ternamente e logo em seguida odiar
magoar,
desprezar, humilhar e escorraçar
que
seres são estes Senhor?
Misto
de anjo e demónio, seres precários
de
vidas curtas, feitos de matéria perecível
mas
com um espírito eterno aprisionado
e
em constante aprimoramento
através
do amor, e do cruel sofrimento!
Arlete
Piedade Louro
Editado
no livro "Falar Poesia"
LOJA DE RARIDADES (Crónica)
Há dias, voltando de
visitar um cliente, ao passar junto a uma velha montra, algo me chamou a
atenção.
Ainda tinha uns
minutos, pelo que resolvi entrar e visitar aquela loja que tinha sido objecto
de uma reportagem no jornal local de maior circulação, há alguns meses.
Mal transpus o limiar
da porta e comecei a mirar o motivo da minha curiosidade, e logo um velho
homem, alto e escanzelado, veio ao meu encontro, com um sorriso desdentado no
rosto.
Uns óculos de lentes
grossas cobriam-lhe os olhos cansados de noventa e tal invernos vividos com entusiasmo
e paixão, que ainda brilhavam ao falar do seu negócio.
Negócio? Dificilmente
esta palavra se poderá aplicar àquele espaço que mais parece um museu, ou local
de culto.
Educadamente
dirigiu-me a palavra perguntando em que podia ser útil e ao ver para onde o meu
olhar se voltava, um cintilar de entusiasmo, fez despedir faíscas brilhantes
das lentes dos seus auxiliares visuais.
Tirou então a
carteira do bolso e abriu-a retirando um velho recorte de jornal que desdobrou
cuidadosamente, mostrando-me um artigo sobre o nosso veterano jornalista,
falecido há alguns anos, Fernando Pessa.
Na verdade eles até
são parecidos, pensei eu, relembrando o velho homem das reportagens
interessantes na TV, velha glória que no tempo da segunda guerra mundial,
exilado em Londres, recusava ir para o abrigo, para fazer a reportagem em
directo do estrondo das bombas nazis.
Pensando ir ouvir um
elogio ao jornalista falecido em plena actividade, com mais de 90 anos,
preparei-me, com uma postura atenta.
Mas, o que ele me
mostrou naquele pedaço de papel amarelecido, foi a máquina de escrever que
sobre a secretária, ostentava com orgulho a sua marca "Royal 10".
E então começou a
falar de como tinha aberto aquela sua loja, no ano de 1945, pelo que completava
este ano, o seu cinquentenário e como reparava com paixão todas aquelas
máquinas das quais conhecia em pormenor, todas as peças e seu funcionamento.
Contou como recebia
encomendas de todo o país e estrangeiro, de pessoas coleccionadoras daquelas
maravilhas que sabiam exactamente o que procuravam e ele sabia onde encontrar,
para satisfação do seu cliente e eram tantas as histórias que o meu fascínio
aumentava a escutá-lo atenta e deslumbrada.
Sobre as bancadas,
expostas velhas máquinas, não só de escrever, como também de calcular, daquelas
de manivelas, e também registadoras, que faziam lembrar as dos filmes
americanos, passados nos saloons do oeste, no tempo dos cow-boys.
E mesmo ali, o
objecto da minha maior admiração, uma máquina de fabrico americano, datada de
1910, ostentava a sua raridade, com um magnífico teclado duplo que eu nunca
tinha visto, pois que tinha um com letras maiúsculas e outro com letras
minúsculas, cor branca para um, cor negra para outro, como um piano ou órgão em
miniatura, cuja melodia, seria o bater cadenciado dos seus tipos no papel, por
alguma secretária senhoril, em algum escritório antigo e romântico, onde o
patrão seria o senhor incontestado e talvez amado.
Ou talvez tivesse
pertencido a algum génio das letras, ou da ciência, que imaginei escrevendo as suas
obras em anos idos, de outros tempos, em que a vida era mais suave, e havia
tempo para tudo, para a amizade, o lazer, para dedicar tempo aos parceiros,
para ir ao cinema, e ao teatro, para saborear os prazeres simples e divinos da
atenção dividida.
Agora nesta era
informática e internautica, ficamos atrás dos nossos computadores e escrevemos
num teclado quase silencioso, falamos com pessoas invisíveis que nos dão
atenção e carinho, e uma conspiração de silêncio consentido talvez até
procurado, nos cerca nos nossos lares, e locais de trabalho.
Desejei ser dona
daquela raridade, não para mim, mas para ofertar a alguém que escreve num
computador, cercado de muros de silêncio e incompreensão, tentando com as suas
obras cultivar talentos, e ser pago em afecto e carinho.
Mas os muros de
presenças invisíveis criados por esta nossa era, em que não podemos falar
olhando nos olhos das pessoas a quem dedicamos a nossa atenção e amizade, em
que distâncias imensas, não apenas físicas, mas de convenções e compromissos,
nos impedem de tocar a pele, e escutar o timbre da voz a não ser através de
máquinas, que tantas vezes distorcem as intenções e escondem os afectos e
desejos sinceros e reais, impedem essa colheita tão apetecida e merecida.
Por isso um presente
assim, uma raridade, símbolo de outros tempos, instrumento de escritores e
artistas, seria um presente perfeito, pensava eu ao sair daquela loja-museu, e
encaminhando-me para o meu carro, pensativa e sonhadora.
Arlete Piedade Louro
Publicado no livro ERA NO TEMPO DE...Crónicas de Outras
Épocas
(edição de autor) e jornais, sites e blogs na Internet.
OS HOMENS TAMBÉM CHORAM!
(Conto)
Eram apenas sete horas da
manhã, naquele dia do início de Março, mas o calor já se adivinhava
insuportável. O carro estava parado na fila do meio na auto-estrada , como em
todas as manhãs dos últimos cinco anos e Manuel tentava conter a ansiedade como
sempre em todos os outros dias em que se dirigia para o trabalho.
Ligou o rádio num gesto entre
impaciente e resignado. Já sabia o que ia ouvir:
- Senhores ouvintes, a
temperatura prevista para hoje em Lisboa, situa-se entre os 35º graus de máxima
e 25º de mínima. Alerta laranja activado em dez distritos do continente. Alerta
vermelho na zona da grande Lisboa e grande Porto. Não se esqueçam de levar
consigo as garrafas de água para manter a hidratação! Não expor a pele
directamente ao sol! Crianças e velhos devem manter-se em casa! – E prosseguia
o locutor:
- Trânsito congestionado nas
principais vias de acesso á capita! Também no grande Porto e na Via de
Circunvalação trânsito com demora acentuada! – mas Manuel já nem ouvia o
locutor, era sempre assim todas as manhãs. Tocou no comando instalado no
volante, para procurar uma outra estação de rádio, que lhe desse música
relaxante e calma!
Mas só encontrava os sucessos
barulhentos do momento....Irritado desligou o rádio. Olhou pela janela e
reparou na ocupante do carro ao lado. Ela sorriu-lhe e ele retribuiu o sorriso
fazendo um gesto de resignação que pretendia abarcar as filas e o trânsito e o
mundo em geral.
Ela retribui com um encolher de
ombros e ele não pode deixar de reparar naqueles ombros morenos, que estavam
desnudados pelo vestido. Não conseguia ver bem, mas aparentemente ela usava um
vestido ou blusa sem ombros, apenas cingido no busto por aquelas filas de
franzidos que estava na moda.
Os seios pareciam ser grandes e
os olhos escondidos atrás dos enormes óculos escuros, apenas se podiam
adivinhar. Como seriam os olhos dela?
Os cabelos eram curtos e
louros, com uma franjinha caída para a testa ampla. O trânsito na fila ao lado
avançou e a mulher arrancou devagar. O carro dele não saíu do mesmo local
entretanto, mas Manuel não se irritou. Sabia que dentro em pouco se voltariam a
cruzar mais á frente noutra fila.
Agora era a sua vez de
arrancar. Seguiu em frente devagar, quase automáticamente, e voltou a ligar o
rádio. Agora passava uma música antiga de Elton John. Ficou a ouvir e a
recordação da esposa voltou com maior força agora. Era sempre assim. Em
qualquer circunstancia do dia a dia, inesperadamente, lá voltava o fantasma do
passado para o atormentar.
De repente viu-a á sua frente,
como naquele dia em que ela lhe tinha pedido o divórcio. Escutou as suas
palavras agressivas de novo:
- Vai-te embora de vez!
Deixa-me em paz! Nunca me amaste! Vai para as tuas amantes! Para que me hei-de
esforçar para te dar esse filho? – Para ficar no mundo mais uma criança sem
pai?
Ela não o compreendia, nunca
tinha compreendido a sua necessidade de ter um filho para dar continuidade ao
seu nome, para lhe fazer companhia e brincar com ele. Como sonhava com esse
filho! Imaginava que iriam passear ao parque, que dariam grandes caminhadas,
que iriam jogar á bola, imaginava que ensinaria ao filho tudo que tinha
guardado dentro de si, fruto de longas horas silenciosas de reflexões, as
descobertas sobre o coração humano, as tentativas inglórias de compreender
aquela mulher que era sua desde a infância comum passada na aldeia!
Ela sempre tinha sido sua,
continuava a ser sua, mas como lhe fazer entender isso? – Agora era tarde,
pensou pela milésima vez. O divórcio tinha sido decretado na semana anterior ,
era um facto irregovável que no entanto não sabia se iria aceitar alguma vez.
A fila estava de novo parada.
Meteu a mão no saco a seu lado e pegou na caixa de chocolates. Comeu um
quadrado sem pensar! O doce derreteu-se-lhe na boca! Seguiu-se outro e outro
mecânicamente! Sempre tinha gostado de comer, por isso estava um bocado acima
do peso.
Ela sempre o aborrecia por
isso. Agora pelo menos já não a iria ouvir a chateá-lo. Aproximavam-se das
portagens e o carro da frente travou bruscamente devido a outro ter mudado de
fila inesperadamente. Sem ter tempo de reagir e fragilizado pelas suas
recordações de um casamento fracassado, Manuel embateu violentamente no carro
que fez peão e ao bater no separador capotou aparatosamente.
O seu carro tinha-se
imobilizado com uma violenta travagem e Manuel saiu em socorro do outro
condutor. Não tinha reparado que era o carro da mulher loura. Ela estava presa
no cinto de segurança e sangrava da cabeça. Antes de mais nada ele telefonou
para o serviço de emergência médica e enquanto esperava a chegada da
ambulância, deitou-se no alcatrão a seu lado, acariciando-lhe os cabelos que
rapidamente estavam a ficar empapados de sangue.
Ela naquele momento
representava todas as mulheres, as que tinham passado fugazmente pela sua vida,
as primeiras namoradas, as amantes, a esposa! Em especial a esposa!
Murmurou, sentindo o rosto
molhado:
- Perdoa-me, perdoa-me! Não
morras, não te vás! Deixa-me conhecer-te melhor! Não me abandones!
Ouviu os silvos da ambulância
que chegava, e afastou-se para dar a vez aos paramédicos! Entrou no seu carro
mas ao ligar a ignição nada se ouviu! A porcaria do carro tinha ficado mais
afectado do que ele suspeitava.
Agora era a brigada de trânsito
da GNR que o chamava para fazer o Auto de Ocorrência. Respondeu mecânicamente
ás perguntas, assinou onde lhe pediram, e recusou a ajuda que lhe ofereciam sem
pensar. Ficou junto ao carro imobilizado e pegando no seu telemóvel chamou um
pronto-socorro, para o levar para a oficina.
Quando este chegou, deu as
indicações necessárias, e recusou ajuda mais uma vez. Lentamente e sem olhar os
carros que se desviavam dele para não o atropelarem, dirigiu-se á berma da Auto-Estrada.
Passou as pernas pelo separador, e deixou-se cair no talude cheio de ervas que
ainda deviam estar verdes, mas já estavam a secar naquele início de Primavera,
que se comportava como o fim do Verão. Afastou-se perdendo-se entre os
matagais! Para ele não havia estações do ano. Tinha deixado de haver Primavera,
ou Verão! Seria sempre Inverno doravante!
Arlete Piedade Louro
Editado no livro "Contos de Natal e Outros"
Estimaga Amiga e Ilustre Poetisa, fico radiante por Si.
ResponderExcluirMeus sinceros parabéns.
Abraço amigo