quinta-feira, 3 de junho de 2010

Ana Merij

_ imponderável_
.

o vento arrasta os lixos noturnos
e leva nas suas asas um poema sujo de sangue e fel
onde a poesia escondeu as vergonhas do mundo
.
deus anda, desanda e vem
pela ruas de uma noite comprida
segurando a manhã entre seus desígnios
assim como faz com a prometida redenção por cristo
.
uma criança geme na calçada de fome e frio
com seus olhos gastos a fitar o ocaso do inverno
.
homens crucificados nas marquises
dormem como sobras de ontem,restos:
- da vida, ou do destino?
.
a madrugada não termina
o anúncio de um novo dia é uma fraude
.
os carros passam em disparada
escarram no asfalto, cospem no meio fio
as bocas de enormes latas de lixo são reviradas
por baratas, por ratos, pelas unhas dos mendigos
.
mas, deus caminha reto com seus passos de rei perdido
pela madrugada torta e sobrevoa as alamedas desertas
.
sob as luzes de neon folheia as noticias de ontem:
- prostitutas são assassinadas na avenida atlântica
- mulheres pariram natimortos nos hospitais sem porta
- famílias pranteiam seus mortos que estavam no navio
- o acordo sobre a bomba nuclear é uma farsa
- um ladrão na escuridão vai matar o turista
-...

.
ele sabe, ele conhece, ele escuta, mas permanece tardio
e o vento, junto com os lixos noturnos arrasta a poesia inútil
.
o poeta chora seu poema sujo, e engole seu grito:
- impotente e vazio!
.

anadeabrãomerij

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