O Brasil é maior que as academias de letras
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Pelos quatro cantos do Brasil fala-se da importância da cultura, principalmente quando de eleições, sejam elas municipais, estaduais ou federais. Passadas as eleições o assunto cai na mornidão. Caso alguém, eventualmente, questione, de pronto vem a enfática declaração: o Brasil é um país sem cultura. E é sobre isso que se pretende refletir.
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Certamente, quando alguém se refere ao “sem cultura”, o termo é tomado mais que em seu conceito amplo, apenas se referindo à instrução obtida nos bancos escolares. Ou então, refere-se à sectária cultura da intelectualidade, livresca, literária. Esquece-se de que, por cultura, em termos antropológicos, se deve entender como a maneira de viver de um povo.
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Povo, outro conceito equivocado, aqui tomado como população. Enquanto por “população” se entende o contingente presente no momento a que se refere o discurso, “povo” é mais que isso. Povo é o conjunto humano de todos os tempos, presente e passado, com projeção para o futuro. Cultura é do povo, de ontem e de hoje, transmitida de geração a geração, não necessariamente escolar.
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Deixemos de lado o enfoque “cultura” em seu conceito antropológico amplo, para nos referirmos a uma fração apenas: tomemos a cultura no sentido de língua vernácula. Mais que no sentido coloquial, vamos nos atentar para a língua em sua concepção formal. A língua objeto dos documentos oficiais, a língua formal, denotativa.
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Pergunta-se: quando de elaboração de quaisquer alterações ou normatização da língua padrão, a quem cabe a competência de opinar sobre a questão? Por princípio espera-se que a resposta recaísse nas categorias ligadas às profissões pertinentes: filólogos, gramáticos, lingüistas, literatos. Profissionais de militância de órgãos e entidades de representação superior da língua.
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Como sujeitos intermediários do processo até que tais profissionais podem ter suas contribuições registradas. Entretanto, em se tratando de acordos internacionais, a quem cabe a assinatura em nome da cultura formal, padrão, do País? Por exemplo, na assinatura de acordos ortográficos, como o de 1943, posteriormente objeto de lei específica?
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No caso ilustrativo coube à ABL-Academia Brasileira de Letras assinar com a Academia de Ciências de Lisboa-Portugal. Uma vez acordado, tem lugar sua legitimação em lei, com a sanção do Presidente da República, após aprovação legislativa. À época retratada (meados do século passado) justa foi a competência da ABL para opinar na questão. Talvez fosse ela a única entidade literária de então em condições de propugnar sobre o assunto enfocado.
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Sem desmerecer a importância da ABL, ainda a entidade mais significativa nacionalmente em termos de status e impacto, hoje a situação é outra. Além da ALB, “n” outras instituições e entidades literárias marcam presença por este Brasil afora, algumas delas de amplitude nacional e até internacional, a exemplo da ALB-Academia de Letras do Brasil e da Associação Internacional de Poetas Del Mundo.
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A particularidade de ter ou não proporções internacionais não vem ao caso, mas tão somente a representatividade nacional. Até porque, dadas as condicionantes estatutárias, a ABL tem quadro limitado, nos padrões da Academia Francesa, com 40 acadêmicos. E essa limitação dificulta à ABL ter um alcance nacional, visto que em seus quadros, ao longo da história, aquele sodalício representa pouco mais que o Sudeste do País.
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Além do Sudeste, outras duas ou três ilhas culturais e literárias do Brasil marcam presentes na ABL. São os casos da região Sul, do litoral do Nordeste e representações de “notáveis” do congresso nacional e um ou outro inquilino temporário do Palácio do Planalto.
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Das regiões Norte e Centro-Oeste raros são os laureados com uma cadeira na Casa de Machado de Assis. Mesmo assim estas “raridades” dependeram do livre trânsito no Sudeste do Brasil, principalmente na metrópole sede da Academia, ou de alguma circunstância de conveniência histórica, como foi o caso do único goiano a ocupar uma cadeira do sodalício com sede na metrópole carioca.
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Não se tem com este escrito a pretensão de interferir na constituição da ABL. Longe deste escriba esse atrevimento. O que aqui se pretende questionar é a representatividade – ou não - de uma entidade como a ABL em termos nacionais, em que pese a sua honrosa e meritória constituição acadêmica. Valorosos nomes, dignos de todo o respeito. Entretanto a ABL, por si só, não representa o Brasil como um todo. O Brasil é maior do que qualquer academia de letras.
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Diante do acima exposto, então, qual o enfoque central da questão? O que se pretende com este questionamento?
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Em sua modéstia e limitação, este escriba questiona e propõe que, ao buscar parecer da classe literária do Brasil, talvez melhor dizer categoria que classe, que se atente para que todo o Brasil seja ouvido.
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Pelas academias de letras estaduais por este Brasil afora pode-se encontrar personalidades literárias de legítimas condições para integrar, juntamente com a ABL, um colegiado de alto nível para tratar de questões que digam respeito ao interesse do País como um todo.
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Além das academias estaduais de letras e do DF, recomenda este escriba, que se busque a representação também das entidades que tenham representatividade em todo o território nacional, a exemplo da Confederação das Academias de Letras do Brasil, da Associação de Poetas Del Mundo e da ALB-Academia de Letras do Brasil.
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Fica aqui registrado mais um sonho hoje utópico e que amanhã poderá ser real: o de um Brasil integrado também pela literatura. Enquanto isso, que os escritores do Brasil se empenhem mais e mais na busca de melhor representarem suas regiões em particular, representarem o território nacional e, sobretudo, de representar a raça humana, seus sonhos, suas aspirações, suas realidades.
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Quem sabe, assim, o amanhã poderá ser melhor para todos.
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José Faria Nunes
Cônsul de Poetas del Mundo em Goiás – GO
Secretário da Associação Internacional Poetas del Mundo
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