sábado, 6 de novembro de 2010

Francisco de Assis Vitovski







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FELIZES ANOS VELHOS
      Francisco de Assis Vitovski
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Hoje me olhando no espelho
Vi um bigode tordilho
Parecendo o velho caudilho
No raiar da madrugada
Lambuzando seus bigodes
Num prato de coalhada.
Ou na sombra da varanda
O sisudo coronel
Branqueando seus bigodes
Num prato de farinha e mel.
 .
Mas os cabelos tosquenos
Fazem lembrar dos anos
Que passam qual vento louco
Aquele que se arrodeia
Levando o saci pitoco.
E lembro me arrepiando
Que pra bombacha da vida
Já não tem mais muito pano.
 .
Assim, banhado e barbeado
Lavado com champú grudento
Que é pra alisar nossa pele
Que se esfacela no tempo
Costeletas bem tosquedas
Lembram as tardes de sábado
Quando pra ver a peona
As partes eram asseadas.
 .
Os dedos engruvinhados
Por uma tal de artrite
Não deixam alisar a cuia
Hoje esculpida em grafite
Pois já perderam a destreza
Que antes os manobrava
E na escapulida da sogra
Que sempre nos vigiava
Eu alisava os seios
Da peona que eu amava.
A chaleira pego de gancho
Como se fosse o atanaz
Que catava as coisas quentes
Do fogo de chão lá no rancho.
E a palma lisa das mãos
Calos não mostra mais
Não tem o sinal das rédeas
Nem da argola do talo
Ou muito menos a amostra
Do deslizar do laço
Enlameado de bosta.
 .
Cadê o mate de outrora
Feito com erva cancheada?
Hoje não tem mais preparo
A erva já vem triturada
Não existe mais chaleira
Fogo a lenha não tem mais
Só um foguinho azul
Que sai de um bico de gás.
A água fica sem gosto
E vem dentro de uma térmica
Bem por isto há muito tempo
Que mate não tomo mais.
 .
O alarido dos netos
Me faz lembrar da infância
Meu neto não brinca de laço
De laçar vaquinha parada
Não usa mais tirador
Nem bombachinha listrada
Brinca num tal computador
De uma telinha quadrada.
 .
Minha neta de mansinho
Vem querendo me assustar
Com uma coisinha que pisca
Uns botõezinhos de números
E uma luzinha faísca
Diz que é um celular
Que fala, grava e retrata
Pode até telefonar
E vai tirar meu retrato
Pro universo vai mandar
E que o povo de outras bandas
Vai poder me observar.
Não sei se fico sério ou se rio
Não quero mostrar os dentes
Que já não são grande coisa
Alguns até são ausentes
Melhor não, minha netinha
Guarde essa maquininha
Pois se a foto vai pro mundo
Vai que São Pedro me vê
Assim, sem bombacha e sem terno
E me achando muito imundo
Pode me mandar pro inferno.
                                                                

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