domingo, 9 de maio de 2010

Lêda Nova

Filho Meu

Ah! que saudades eu sinto de você. Do seu cheiro de bebê, covinhas na face, pés e mãos tão pequeninos. Nostalgia do primeiro sorriso, palavras balbuciadas, reconhecimento original de mim. Vê-lo engatinhar, cair e levantar para novamente ir para o chão, se erguer e andar.
Do leite de peito mamado, berço embalado, das noites plenas de canção de ninar. Dorme neném do meu coração... Dorme... Meu neném...
Ih! quantos anos se passaram. Aquela doce criança de antes é hoje um ser humano adulto, independente, senhor de si, dono do próprio nariz. Provavelmente nem se lembra dele mesmo vestido de pijama, abraçado ao urso de pelúcia, a ouvir-me contar, seus olhos quase fechando de sono, histórias de heróis e vilões, confrontos sugestivos da vitória do bem contra o mal.
Na minha alma vibra o anseio de outra vez colorir a vida com seu pincel da inocência, entregar-me sem medo, com a coragem da infância, a cada instante vivido ou inventado. Construir castelos, reis e rainhas, conversar com fadas e duendes, suaves mecanismos da criatura e do criador. Arrumar letras até formar palavras que invoquem o belo e a arte, no imaginário ou em realidade, afinal a pretensa diferença tem alguma relevância?
Eu grito: meu filho!
Eu grito e o eco do silêncio me entrega: filho meu!
Meu filho que o deus Tempo transformou em filho meu! Pois devagar, mas de forma inexorável e às pressas — este é o processo de crescimento e da própria vida — o tempo foi arrastando o meu do filho até depois do sujeito da sentença, filho meu, agora não mais no contexto possessivo, entretanto no de função de complemento da oração, tal qual a forma oblíqua do pronome eu, filho de mim.
Uma vez que os deuses adoram uma picuinha, como não poderia não ser o deus Tempo invejou a completude do primata meu materno e introduziu a cama na frente do berço, eta! competição mais desleal, não restando à mãe alternativa sadia (e bendita!) a não ser aplaudir o soltar de asas e voar do filhote, que me perdoe todo psicologismo e as mulheres ainda presas à cruel síndrome do ninho vazio.
Ah! quer saber de uma? Contabilizando perdas e ganhos, receitas e despesas e muito embora a avareza enciumada da divindade, o meu continua meu, no real só deu passos para frente, é natural. Na memória celular, psch! nessa memória, sim senhor! permanece por eterno a tamanha, deliciosa e, ai meu Deus, tão ilusória sensação de pertencimento.
Foi tão-só uma folha já seca deixada em solo fértil, uma linda flor colorida a nascer, um ciclo que se findou para dar lugar ao fresco e ao novo,
Para sempre filho de mim, filho meu, eis a questão.
Quaisquer seja o tempo, movimento, linha, ponto, proporcionalidade, espaço, dimensão. Mãe e filho unidos pela linha tênue, porém forte do cordão umbilical do amor.
De sorte que vem filho meu, aconchegue-se em mim.
Deixe eu lhe fazer um afago, dar um abraço, dizer do poder da intenção e do sentimento, encantamento dos deuses sob a tutela do Senhor.
Segure minha mão. Vamos comer pipoca e bombom de chocolate, chupar picolé, tomar guaraná. Sorrir das estripulias do palhaço do circo, viajar pelo mundo em cima do cavalo do carrossel do parque. Brincar de bola e de casinha.
Abrir canais, atravessar pontes, chegar ao destino. Deixar fluir.
Fazer emergir nossa amorosidade, minha porção feminina, mãe, mulher. Perfume de terra, onda de água, lareira de fogo, passarinho no ar.
Filho meu! As estrelas nos acolhem, abençoados que somos pela decisão Dele, melodia do som do Amém.
Em 07 de maio de 2010.
Lêda Nova
ledanova@uol.com.br
www.ledanova.com
77/8804 4200

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