quinta-feira, 5 de abril de 2012

MEMBRO: ROZILDA JACINTA

Rozilda Jacinta - Professora de Língua Portuguesa, Literatura e Inglês nas redes públicas de Contagem e Betim, com especialização em Língua Portuguesa (CENEX – FAFI-BH) e Educação Musical (ESCOLA DE MÚSICA DA UFMG)
Secretária Executiva do Conselho Municipal  de Cultura e do Patrimônio Ambiental e Cultural de Contagem por 12 anos.
Membro da equipe técnica da Diretoria de Memória e Patrimônio Cultural de Contagem, responsável pelos trabalhos de preservação do patrimônio ambiental e histórico-cultural do Município.
Conselheira fundadora e membro da Academia Contagense de Letras – ACL.
Presidente do Coral Musicanto de Contagem, fundado em agosto de 1998, por dois mandatos (4 anos)
Integrante  do Coral Musicanto de Contagem, como cantora soprano.
Coordenadora e Regente do Projeto Coral na Escola – E. M. Francisco de Sales Barbosa (Betim-MG)
Coordenadora e Regente do Coral Infantil do Instituto Novos Tempos (Contagem-MG)
Regente do Coral Infantil da Escola Municipal Sandra Rocha –  Projeto Rouxinol: musicalizando a escola – Secretaria de Educação e Cultura de Contagem, de 2002 a 2005.
Professora de flauta doce na Escola Municipal Sandra Rocha
Professora de flauta doce na Escola Municipal Francisco Sales Barbosa
Membro e fundadora do Grupo Pasárgada – Movimento de Vida e Arte
Cidade: Esmeralda - MG
E-mail: rozildajacintalopes@gmail.com






Ausência

Eu quero uma vida assim: sem relógio e sem dedo em riste,
sem lei, sem más notícias, cara feia, sacanagem, mal humor.

Eu quero uma vida assim: construída todinha em outono azul, 
de movimentos leves, sons adocicados, sutilmente coloridos de verde.
Um eterno amanhecer de promessas, possível, plausível, felicidade.
Éden, Eldorado, Canaã, Xangri-lá? Aqui? Paraíso perdido? Achado?

E fico entre o desejo e a dúvida: quero, mas não quero, querendo.
Minha razão confirma:  não há a possibilidade mais remota
nem aqui, nem agora, talvez nunca, de esse mundo vir a ser.
Mas meu coração teima: ora, por que não querer?

Então, decido: o que eu quero mesmo é  instaurar o tempo do não-sofrer.

Um tempo de mãos dadas, de caminhar no brilho das estrelas,
de admirar borboletas, calangos ao sol, mãe-peixe, elefantes voadores.
Tempo de todos os sonhos, coelho na cartola, goiaba roubada.
Todo o querer. Da dor, ausência. Todas as cores nas pontas dos dedos.

Decido. Mas meu querer não é tudo e limitado é meu poder.
Minha palavra se esvai e este papel se amarela, aquarela, quimera.


E, então posso medir-me e minha condição comprovar humana
e a aceitação da dor da minha morte, do meu destino de gente
é a da saudade, da minha total  e absoluta impotência
diante da condenação à  necessidade vital, danada de sofrer,

E nada sou,  e nada posso, e nada devo!
E, no meu coração, a chama tênue se mantém um quase nada,
só mesmo pra não morrer de ausência.

Contagem, 10 de abril de 2000.
Rozilda Jacinta



Divagações em Bach

Meia-noite.
Na tela do computador a página em branco
é um convite fácil à inspiração (que não vem).
Estalado na língua, o gosto doce do vinho
é um convite possível ao prazer (que não posso).

Mas a fome dói-me o estômago e divago em Bach
enquanto na panela cozinha um miojo

Toma-me, então, o corpo estranha metamorfose
de arredondadas formas: violino, viola, violão.
E no Concerto me perco, o fim encontro, me buscando,
quando, tão doce e calmamente, por todos os poros,
a música me emudece,  me  penetra e se faz em mim.

Os sons cortam o ar recheado de silêncios: 
não há gestos,  lamentos, nenhum sofrimento.
Uma completa,  total inércia me desfaz em ausência
e toda a matéria se dilui, aos sentidos misturada,
paralisados entre o possível de nós e o agora infinito.

E dedos ágeis e firmes percorrem meus caminhos
insistentemente, buscando a nota mais pura.
E numa carícia violenta retesam minhas cordas
arrancando segredos inconfessáveis, perdidos, tecidos 
em quartos vazios de solidão, lua  e madrugadas..

E, numa seqüência nítida, louca, desvairada
fecho os olhos e,  resignadamente, me entrego
sem redenção, sem pecado,  sem freios, sem norte,
num orgasmo absurdamente perplexo de sons
à loucura inquestionável, total,  absoluta do não ser

E tudo em mim  é música
quando a última nota se cala,
quando meus sentidos se acalmam
e estou em paz.

Rozilda Jacinta – maio/00







Tempo de Ter Tempo


É preciso viver
o tempo certo do tempo:

pegar calmamente o minuto antes que em hora se torne
e, na mão, aprisioná-lo, impedindo seu vôo de beija-flor.
Fazer do dia algo absoluto, misterioso, improvável,
e entregar-se aos sonhos, a todas as possibilidades de amor.

E, quando no espírito se instaurar o cansaço da semana,
decretar como tempo do eterno encontro e da amizade
todas as sextas-feiras iluminadas de lua, música e cerveja.
E, nos olhos, reter, com ternura e firmeza, os dias de sol,
os dias de chuva, de chá quente, chocolate e novidade
e vivê-los sempre como se os primeiros da vida  fossem.

Porque o mesmo tempo que prende em agendas, compromissos,
recepções enfadonhas,  discursos, interesses, gravatas apertadas,
transforma, qual mágica de emoção inexplicável, solta no tempo,
em  abraços, melodia, poesia, amigos, parceria, lealdade, mãos dadas
tudo o que hoje sufoca, enforca, sujeita, limita, incomoda, entristece.

Com certeza, o tempo tudo permite, tudo resolve e tudo  apaga.
Afinal, a memória humana, ao mesmo tempo infinita e limitada
é capaz de guardar apenas o que ao coração agrada.
(Rozilda Jacinta)

 

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