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José de Anchieta Antunes de Souza - ANCHIETA ANTUNES
Recife - PE
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José de Anchieta
Antunes de Souza, nasceu em Olinda, em 24 de janeiro de 1938. Desde jovem
desfrutou do prazer de escrever, sem ter o cuidado de guardar seus textos,
deixados perdidos pelos caminhos da vida. As letras escritas à mão ou em
máquina datilográfica, desceram a ribanceira do esquecimento, do não retorno...
Com 59 anos aposentou-se e estabeleceu residência em Gravatá – PE, onde vive
até hoje, com a esposa, a escritora uruguaia-brasileira Dea G. Coirolo e um dos
netos. Aqui retomou a arte de escrever. Faz parte da Academia de Letras, Artes
e Ofícios Municipais de Pernambuco em Bezerros. Tem dois livros em preparação:
um de crônicas da vida e o outro sob um bebê, desde sua gestação até os três anos
de idade, que conta “segredos ao pé do ouvido do seu avô” e discorre irônica e humoristicamente
sobre o deslumbramento das descobertas que proporciona o crescimento. Vem
fazendo uma coleção de crônicas humorísticas com um personagem chamado Libório,
onde muitas de suas experiências de vida dão um toque às histórias. Aqui
apresentamos uns poemas escritos depois de seus setenta anos de idade quando
resolveu acrescentar poesia a sua escritura. Publicou na Antologia poesia do
Brasil, volume 18, do XXI Congresso Brasileiro de Poesia em Setembro de 2013. Tem
publicações on-line, sendo colunista do blog de Lenilson de Caruaru e como
tradutor oficial da Academia de Letras (ALAOMPE) da língua portuguesa para a
espanhola.
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Crônica
nº 7 - Libório no
Aeroporto
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_Agora não posso viajar, não! Estou
muito doente e melhor seria ir para o hospital.
_Você
nunca esteve tão bem de saúde como agora, e o melhor a fazer é ir preparar sua
mala.
_Mas
você disse que a viagem seria em abril e nós estamos em janeiro!
_Não
custa nada ir treinando, para quando chegar o dia já saber o que tem que
colocar na bagagem.
Liborio
não queria de maneira nenhuma ir para Paris passar quinze dias passeando,
recordando o tempo em que estiveram na
lua de mel. Seria uma viagem de recordações, boas memórias, no entanto Liborio
tem pavor de viajar de avião e por isto mesmo inventa qualquer desculpa, por
mais ridícula e infantil que seja.
Na
fila para fazer o “chek-in” Liborio cochichou
no ouvido de Sonia:_Você sabe que eu só
viajo de primeira classe, né? Então é melhor voltarmos para casa, não temos
grana para uma viagem desta! Vamos...
_Vamos
sim, continuar na fila, esta questãozinha já foi resolvida, nós vamos de
primeira classe, sim senhor!
_Você
é louca? Quer me levar à falência? Devolva as passagens, “AGOOOORAA”!
_Liborio,
por favor, não entre em pânico, não surte; não gastei nem um centavo seu; você
por acaso esqueceu que nós temos dois filhos? Eles providenciaram tudo, sem
ônus para nós, tá satisfeito com seus filhos?
_Sonia,
você é mesmo irresponsável, pedir isto aos meninos, sabendo como eles trabalham
para sustentas suas famílias! Uma despesa extra sem necessidade nenhuma! Só
você mesma! Coitado dos meus filhos...
_Liborio,
você sabe muito bem que nossos filhos são comerciantes bem sucedidos, que esta
pequena contribuição não vai alterar em nada o orçamento deles, e eles tiveram
o maior prazer em nos proporcionar uma viagem confortável.
_Ah!
Meus filhos, nunca imaginei que meus filhos fossem me “TRAIR DESTA MANEIRA, DESCARADAMENTE, SEM NEM AO MENOS ME
CONSULTAR... TRAIDORES...” Pensava
em voz baixa o homem vencido pelas providencias da mulher que o ama tanto...
_É,
mas mesmo assim não vou poder viajar, estou queimando em febre...
Sonia
colocou a mão na testa do marido, apalpou seu braço e disse:_Meu amor, você
está gelado, não tem febre nenhuma, deixe de inventar desculpa amarela!
_Pois
é! Estou com “FEBRE INVERTIDA”. Antes que você pergunte, febre
invertida é febre pra dentro, o calor se transforma e frio glacial, e se eu não
logo para um hospital, vou morrer aqui mesmo no aeroporto, quer que eu morra,
é?
_Febre
invertida? O que é isto? Meu Deus do céu, o medo é profícuo!
_Isto
mesmo, agora você acertou... eu também sou “pró-fico”,
todos nós somos pró-fico. Está resolvido, ninguém vai pra Paris, Praris se quiser que venha praqui... estaremos aguardando no pé daquela
torre de ferro... Sonia, falando
serio, você não acha que seria muito melhor nós irmos para a praia?
_Meu
nego, você não gosta de praia, não sabe nadar, tem medo do mar por causa das
caravelas; você quer fazer o quê no mar? Não senhor, vamos para Paris, afinal
de contas só falta embarcar e fechar os olhos.
_Antes
de fechar os olhos quero e preciso tomar um uísque duplo, não, triplo ou mesmo
o copo cheio, só assim vou conseguir chegar vivo naquela cidade tão distante.
Sonia, você não acha melhor nós irmos para a casa das montanhas? Lá é tão
legal, ar puro, muito verde, cheiro de natureza, ouvindo o farfalhar das folhas
ao sabor dos ventos e por cima, ainda podemos ver o mar, lá longe, de binóculo.
E aquela sala maravilhosa, ampla, cheia de arvores, de folhas como tapete e de
flor do jambeiro! Prometo que logo que
chegarmos vou fazer, eu mesmo com minhas mãos e disposição uma gostosissima
salada de frutas, com os seguintes ingredientes: oito jambos grandes e maduros,
banana maçã, banana anã, banana ouro, banana pacovan, banana São Tomé, banana
prata, banana comprida e suco de laranja, pelo menos esta foi a receita que
minha amiga me ensinou e ficou de fazer pra nós na ultima vez que nos vimos.
Estou aguardando... É só descer para o quintal e colher todas as frutas...
Chegaram
em Paris e Liborio continuava vivo, embora com uma ressaca horrível, uma dor de
cabeça de matar leão, e foi logo dizendo: _Sonia, agora nós vamos morar em
Paris... voltar nem pensar, pode logo ir tratando de alugar um apartamento bem
distante do aeroporto.
_Liborio,
nós podemos voltar de “N A V I
O”!!!!!!!
_Esqueceu
que não sei nadar?
_E
quem disse que o navio vai afundar?
_Você
garante???
Ah!
Liborio, o melhor é você ficar em casa e colocar os pés em água quente e
perfumada com flores de jambeiro.
Anchieta Antunes
Gravatá, 28/01/14.
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A CHUVA
Parou de chover...
O sol
voltou insolente, com ardor abrasivo e luminescente,
próprio de astro rei, que é, sem saber que o é.
Choveu
a semana inteira e as flores estavam tristes, de crista baixa, sofrendo os
pingos constantes, atrevidos e úmidos. De tantas chicotadas que sofreram, os
galhos quebraram-se em dois, em três; viram seus ossos expostos, despedaçados
e sem direito a ortopedista, sem contar com a cama de gesso ou
antiinflamatório. Era para sofrer mesmo a dor do estilhaço.
As
flores que conversavam entre si reclamavam do tempo insólito, rebelde e
atrevido. A rosa dizia pra dália:_Amiga não sei onde foi parar minha
fragrância, meu perfume que guardei com tanto carinho naquele vidrinho que você
me deu no meu desabrochar; o aguaceiro levou jardim afora e não o encontro mais para espargir
bálsamos de felicidade. Não sei o que fazer sem meu principal conteúdo, o que
inebria pardos e coloridos.
A
dália se queixa porque perdeu suas cores pulcras que tanto embelezavam a paisagem bucólica. Dizia: _Sem cores não
sou nada, apenas mais uma entre milhões, não passo de uma estatística.
A
roseira triste e cabisbaixa dizia para sua amiga dália:_Faz uma semana que não
recebo a visita de meus amigos voejando ao meu redor, pulando de galho em
galho, banhando-se neste pequeno lago no meio do jardim.
_De
quem você está falando, amiga roseira, perguntou a dália.
_Ora
de quem! Dos meus amigos pássaros. A “lavadeira”
fazia o maior alvoroço quando mergulhava sacudindo suas asas, cantando uma
cantiga que só ela entendia. O “beija-flor”
sugava meu néctar como quem mama no peito da mãe, depois depositava um
osculo nas minhas pétalas. Conheço os segredos de todos eles, sei onde
nidificam, onde fazem amor, onde põem seus ovos, e onde defendem seus filhotes.
Conheço suas árias de sedução e as do fato consumado. Tenho muita saudade dos
meus amigos, não sei o que fazer para atraí-los para meu convívio.
_Não
se apoquente, minha amiga, logo, logo eles virão, afinal o sol continua
brilhando no firmamento. É só uma questão de tempo e paciência. Até parece que
estou ouvindo o farfalhar das asas do rouxinol; escute, preste atenção...
Nada
é perfeito para todos, enquanto as flores reclamavam do excesso de chuvas, as
raízes acharam maravilhosa a semana encharcada de aguaceiros, pois estavam
escondidas no submundo do imenso jardim; suas goelas repletas de água, e já não precisavam de
nenhuma ajuda de regador. Pelo menos nos próximos dois ou três meses não
sofreriam as agruras da desidratação. Nadavam no córrego da felicidade, da fartura, do “ora-pro-nobis” que nutria a cerca viva.
Venha
mansa
como
quem chora
a
perda da chama,
chegue
devagar
para
não afugentar
o
viço da manhã,
molhe
pacata
como
aconchego de mãe.
Aconteça
serena
para
não alagar
suave
para não matar.
Aproxime-se
dengosa,
diáfana,
envolta
num
manto de nuvens,
encoste-se
molhadinha
cobrindo-me
por inteiro
como
uma donzela no cio,
vamos
urrar juntos
por
toda a eternidade.
O
gramado, tapete verde cobrindo todo o espaço de plantas e flores, saltitava de
alegria, batia palmas com suas folhinhas alegres e espigadas, luzindo a luz do
sol em ascensão. Um bom ouvido podia ouvir a algazarra dos arbustos, das
fruteiras e até mesmo das frutas a serem colhidas maduras prontas para serem
consumidas.
O
sol trouxe não só um pouco de calor como uma grande carga de jubilo, de alegria
e vida florescendo no recanto da nata das flores. O jardim desfilava airoso,
todo orgulhoso de suas cores, de seus perfumes e fragrâncias exóticas, expunha
seu verdor como quem mostra suas qualidades intrínsecas. O sol trouxe vida e
luminosidade, brilhando como um espelho dos contos de fadas.
Nem
tudo estava perdido, ou melhor, tudo estava a salvo com a água que vinha de
longe, caindo no solo gretado, no lombo
dos animais sedentos, nos charcos carcomidos pela seca. O chão rachado absorvia
com voracidade todos os pingos do dilúvio. _Parece que fomos salvos pelo ultimo
grito de socorro, diziam os sertanejos vergados de sofrimento.
A chuva
ressuscitou o moribundo, lavou a
angustia, brilhou nas folhas, sorriu nas pétalas, e voou nas asas do
imaginário.
Anchieta
Antunes - Gravatá – 16/04/14
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FAISCA
Latente, urgente, presente
não vem...
está
no leito da teia
dorme alerta
Ao roçar suave
na pele inerte
abre os olhos ardentes,
domina
com força vulcânica
com lava fumegante
sufoca os sentidos
afaga a lascívia
O amor surge...
de onde?
não cabe pergunta
apenas percebo
a força invisível
que veio instalar-se
no meio do nada
com força de vento
com verdade eterna
Chegou pra ficar
apenas domina
preenche os vazios
dissolve o rancor
afasta a dor
-AMOR-
Anchieta Antunes –
Gravatá – 08/02/13
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POEMA DO CORAÇÃO
I-
Lancinantes dores
contorções avulsas
corpo pesado
cérebro exausto
quebrados os uivos
no corpo fraco.
Músculos,
palpita
ações
receios,
transfigura
ações
elementos
rota
ações,
prova
ações
inter
ações
Infarto.
II -
Coração de bengala
alamedas desconhecidas
elevadores, corredores
branco brilhante
máscaras engomadas
metais fulgentes
cortes precisos
sono intenso
talho fundo.
Hospital.
III -
Veias azuis recebem
pingos cadentes
pulso vermelho
telha rubra
quarto suave
luz esmaecida
vida adormecida
infarto vencido.
Placidez no regaço
do amor primeiro
o milagre do beijo
cadência do amor.
Salvo.
Anchieta Antunes -
Gravatá, 11/02/14.
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